Neste dia 3 de maio, comemoramos o dia do Pau-Brasil. Esta espécie, símbolo do Brasil, é endêmica da Mata Atlântica brasileira e foi explorada à exaustão desde os primórdios da colonização do país. Alguns historiadores alegam que a exploração do Pau-Brasil constituiu a primeira atividade econômica brasileira, seja para a extração da tintura avermelhada da madeira para tingimento de tecidos, seja para o uso da madeira para diferentes aplicações². Devido a séculos de exploração predatória, levamos o Pau-Brasil próximo à extinção, assim como destruímos a maior parte das florestas de Mata Atlântica nesse processo.
É justamente por esta razão que o dia do Pau-Brasil representa uma oportunidade de reflexão. Após a destruição da Mata Atlântica e o avanço contínuo sobre o Cerrado brasileiro, estamos nesse momento acelerando o ritmo de destruição das florestas da Amazônia. Após duas décadas de relativo sucesso no combate ao desmatamento da Amazônia, voltamos no último biênio a aumentar essas taxas a um patamar superior a 1 milhão de hectares por ano. Embora as motivações econômicas por trás do desmatamento da Amazônia sejam relativamente mais complexas do que as que levaram à destruição da Mata Atlântica brasileira há séculos, temos na Amazônia nos dias atuais, a exemplo do Pau-Brasil, espécies madeireiras cujo valor de mercado representam um incentivo para a exploração predatória das florestas. Uma vez empobrecidas pela exploração predatória e ilegal, tais florestas perdem seu valor de uso a ponto de se tornarem passíveis de desmatamento, perpetuando uma lógica de uso da terra bastante semelhante à que impusemos historicamente à Mata Atlântica brasileira.
Não é exagero dizer que o país que tem nome de árvore, paradoxalmente, tem como alicerce de desenvolvimento a destruição de suas florestas. Até os dias atuais, destruímos cerca de 1/5 das florestas da Amazônia brasileira. Isso representa a perda de cerca de 500 mil km2 de florestas, o que equivale a duas vezes a área do estado de São Paulo.
O Imaflora lançou em 2017 a plataforma Timberflow³, voltada à geração de inteligência e de informação qualificada para o setor florestal da Amazônia Tal plataforma se alimenta de um amplo banco de dados oriundo dos sistemas oficiais de controle florestal, voltados a regular as autorizações de exploração, licenciamentos e transações de produtos de madeira realizados nesta região. Através deste banco de dados temos mapeado a evolução da atividade madeireira da Amazônia, sendo que indústria madeireira, ao longo dos últimos 20 anos, tem gradualmente migrado do ‘arco do fogo e do desmatamento[4] para as regiões mais centrais da região (Figura 1). Devido a falta de ordenamento público da exploração florestal e da falta de adoção de práticas de produção capazes de manter as florestas conservadas, chamadas de manejo florestal, esta migração da indústria madeireira regional tem contribuído para o aumento da degradação florestal nas regiões mais centrais da Amazônia.
Além da contínua migração das fronteiras, outro fenômeno que temos identificado através dos bancos de dados do setor florestal é uma forte retração na atividade madeireira da Amazônia nos últimos 20 anos. Em 1998, cerca de 28 milhões de metros cúbicos de madeira em tora eram explorados na região (Lentini et al. 2003), sendo que em 2020 esta produção era de cerca de 10 milhões de m3 (Tabela 1). Embora os principais estados produtores de madeira continuem a ser os mesmos aos registrados há 20 anos (Pará, Mato Grosso e Rondônia concentram 87% da produção de madeira em tora da região), os principais polos de processamento de madeira estão hoje localizados em regiões distantes do arco do fogo e do desmatamento, como Colniza e Aripuanã (noroeste do MT), Santarém, Prainha e Aveiro (oeste do PA), além de Porto Velho (norte de RO). Em 2020, ainda, cerca de 3,2 milhões de metros cúbicos de produtos serrados e beneficiados de madeira foram comercializados a partir dos polos de produção da Amazônia, constando os municípios de Paranaguá, São Paulo, Curitiba, Fortaleza e Brasília entre os principais consumidores. De acordo com os dados do IBAMA (2019), cerca de 9% da produção madeireira da Amazônia está sendo exportada nos dias atuais.
Tabela 1. Tabela síntese sobre a indústria madeireira da Amazônia em 2020¹.