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Do campo ao prato: caminhos para uma transição agroalimentar justa e de baixo carbono

30/09/2025

O Brasil encontra-se em uma encruzilhada histórica de seu sistema agroalimentar. A conclusão formada no “Aterra”, encontro realizado em São Paulo para marcar os 30 anos do Imaflora, saiu de um debate entre os pesquisadores Paula Packer, chefe da Embrapa Meio Ambiente; Arilson Favareto, professor titular da Cátedra Josué de Castro da USP e pesquisador do Cebrap; e Pedro Zanetti, especialista em transição de uso da terra, sistemas alimentares e bioeconomia do Instituto Clima e Sociedade (iCS). Mediada por Marina Piatto, diretora executiva do Imaflora, a mesa "Do campo ao prato" analisou os caminhos para uma transição que seja justa e de baixo carbono ao mesmo tempo, apontando desafios, oportunidades e soluções práticas.

 

A trajetória do Brasil, como apresentado por Paula Packer, é marcada por fases distintas: de importador de alimentos nas décadas de 1960, o país passou por uma expansão baseada em ciência e tecnologia, e hoje, desenvolve plataformas de produção sustentável. O desafio global de aumentar a produção sem provocar impactos ambientais abre uma janela de oportunidade única para o Brasil, que já possui 77% de sua agricultura baseada na agricultura familiar e 55% no uso de bioinsumos, segundo Packer. “É preciso combinar políticas macroeconômicas, pesquisa e desenvolvimento agrícola, e fortes programas de proteção social e ambiental. Lidar com esse desafio requer abordagem sistêmica, gerenciada de forma sustentável e ética”, afirma.

 

Para Arilson Favareto, um ponto importante a ser considerado é a heterogeneidade da agricultura brasileira, que conta com várias formas de produção, distribuição e consumo de alimentos. Favareto alerta para o esgotamento do modelo de produção atual, que elimina a diversidade de espécies alimentares e fortalece o consumo de ultraprocessados. A transição, para ele, ocorre em três campos que ainda não coexistem de forma harmoniosa: a produção convencional, as inovações com bioinsumos e as experiências no campo do consumo. O resultado dessa desconexão é o agravamento de problemas como desmatamento e contaminação por agrotóxicos.

 

Pedro Zanetti reforçou a dimensão ambiental da crise, lembrando que 75% das emissões nacionais de gases de efeito estufa estão associadas ao uso da terra e à agropecuária. “A perda de 15% da superfície de água do país, a monotonia alimentar e a contaminação dos recursos hídricos por pesticidas são alertas urgentes. A saída, contudo, está ao nosso alcance: o Brasil já dispõe de tecnologias comprovadas, como os Sistemas Agroflorestais (SAFs), a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e os bioinsumos, que podem liderar uma revolução resiliente”, explica Zanetti.

 

O grande obstáculo, portanto, não é tecnológico, mas institucional e político. Por que a transição demora? Para Packer, o convencimento do produtor passa inevitavelmente pela viabilidade econômica. “O Plano ABC só se faz com remuneração”, afirma. A próxima revolução, na sua avaliação, virá do microbioma do solo, reduzindo insumos e custos. Já Favareto argumenta que o consumo de ultraprocessados é um problema multidimensional, envolvendo preço, cultura e desigualdade. A solução exigirá uma combinação de incentivos tributários para alimentos saudáveis, regulação e campanhas públicas.

 

Para isso, é crucial colocar a inclusão social no centro da transição. Zanetti destacou a necessidade de engajar a juventude rural com tecnologia e capacitação, citando o modelo das Escolas Famílias Agrícolas. Favareto alertou que um terço dos postos de trabalho no campo desapareceram nas últimas décadas, e que políticas, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), precisam ser reformuladas para serem mais eficazes e coordenadas.

 

O caminho está mapeado. Ele requer a coragem de redirecionar incentivos, descontinuando subsídios a práticas predatórias e ampliando o financiamento para modelos sustentáveis e socialmente justos. A transição para um sistema agroalimentar de baixo carbono não é apenas uma agenda ambiental, é a única estratégia viável para garantir avanço no campo, saúde no prato e um futuro resiliente para todos.

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