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Taxonomia sustentável: o desafio de alinhar finanças, produção e transição ecológica no Brasil

03/10/2025

Da soja ao café, passando pela pecuária e florestas, taxonomia brasileira busca definir parâmetros de sustentabilidade para atrair recursos e acelerar a mitigação climática

A transição para uma economia de baixo carbono exige não apenas tecnologias e avanços em práticas sustentáveis, mas também um sistema claro de classificação que oriente políticas públicas e fluxos financeiros para investimentos. É nesse contexto que ganha corpo a Taxonomia Rural Sustentável, um dos eixos do Plano de Transformação Ecológica do governo federal. Prevista para ter sua primeira versão publicada em outubro de 2025, a taxonomia busca definir de forma objetiva o que pode ser considerado sustentável na agropecuária e em demais setores, criando uma linguagem comum entre governo, produtores, investidores e sociedade civil. Durante o evento Aterra 2025, realizado em comemoração aos 30 anos do Imaflora, a construção da taxonomia do agro brasileiro foi tema de um dos painéis.

 

Segundo o gerente de Ciência do Clima e de Inteligência de Dados do Imaflora, Paulo Camuri, a importância da taxonomia está em “atrair recursos e apoiar a mitigação climática”. Ele ressalta que a proposta não deve se limitar a critérios ambientais, mas também contemplar dimensões econômicas, sociais e de biodiversidade. O principal desafio, segundo ele, é a heterogeneidade do agronegócio brasileiro, marcado por realidades muito distintas em termos de escala, práticas e territórios.

 

Para o Ministério da Fazenda, a taxonomia integra o Plano de Transformação Ecológica, que pretende tornar visível o volume de investimentos necessários à transição dos setores produtivos. Seus objetivos estratégicos incluem a geração de emprego, a promoção de justiça social e a mobilização de instrumentos financeiros, fiscais, creditícios e regulatórios. “A taxonomia é um plano vivo, sujeito a constantes mudanças”, afirma a coordenadora de negócios da pasta, Camila Stefani, lembrando que a construção tem sido participativa: entre novembro e março, mais de 4 mil contribuições foram recebidas em consulta pública.

 

A governança do processo é complexa. O fluxo decisório passa pelo Comitê Interinstitucional da Taxonomia Sustentável Brasileira (CITSB), pelos comitês supervisores e pelos grupos técnicos setoriais, que contam com governo, sociedade civil e consultores especializados. Um dos instrumentos centrais é o Caderno CNAE-A, dedicado à agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura. Nessa primeira fase, as prioridades incluem soja, milho, café, cacau, pecuária de corte e leite, florestas plantadas, regeneração natural assistida e pesca do pirarucu.

 

O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) já possui políticas relevantes, como o Plano ABC+, voltado à disseminação e implementação de tecnologias sustentáveis. Mas a taxonomia busca ir além: “Hoje, a sustentabilidade tornou-se fator de atração de crédito”, afirma o coordenador de financiamento no Mapa, Jonathas Moreira.

 

No setor financeiro, a taxonomia é vista como instrumento de padronização e transparência. Para a gerente de sustentabilidade da Febraban, Cíntia Céspedes, ela funciona como um guia para identificar onde estão os recursos e para onde estão indo. “Os grandes projetos conseguem avançar, mas os pequenos enfrentam custos inviáveis. Muitas vezes, o timing do recurso é mais importante do que o valor em si”, observa. A Febraban lançou em 2015 seu Guia Verde, atualizado em 2021, considerado uma primeira experiência de taxonomia. Desde 2008, o setor bancário já incorpora diretrizes socioambientais, originadas em regulação do Banco Central.

 

A federação apoia o plano de transição ecológica e defende que a taxonomia seja implementada em escala, permitindo diálogo com políticas públicas, incentivos direcionados e até tratados internacionais. A clareza na classificação deve também impulsionar o mercado de carbono.

 

O setor privado já se movimenta. No Itaú BBA, há uma área especializada em agro dedicada a alinhar práticas ESG e incentivar boas práticas entre clientes. Para o head ESG Agro do banco João Adrien, a taxonomia “facilita de forma significativa a organização das carteiras”, tornando-as mais atrativas para investidores. Ele defende que o foco esteja nos resultados (outputs), como mitigação de impactos e ganhos de produtividade, além dos insumos (inputs) aplicados. O desafio central, segundo Adrien, é a escala: enquanto grandes players têm condições de adotar padrões de sustentabilidade, os pequenos produtores enfrentam dificuldades financeiras e técnicas.

 

Segundo Stefani, a expectativa é que, após a publicação dos cadernos setoriais da taxonomia, possivelmente em outubro de 2025, haja um período de testes e ajustes. O próximo passo será a criação da taxonomia do imóvel rural, ampliando o escopo das políticas públicas e integrando a agricultura familiar. A participação da CONTAG é considerada essencial nesse processo, ainda que a heterogeneidade do segmento imponha obstáculos.

 

O ponto de convergência entre governo, bancos e sociedade civil é que a taxonomia deve se consolidar como base comum de entendimento, capaz de alinhar expectativas, mitigar riscos e atrair investimentos. A classificação do que é sustentável (e do que não é) será decisiva para orientar bilhões em crédito, ampliar a transparência e acelerar a transição do Brasil rumo a uma economia verde, inclusiva e competitiva.

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