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Brasil precisa modernizar a pecuária para reduzir as emissões do clima

12/10/2015

O governo tem o mérito de anunciar metas para cortar emissões do aquecimento global. Para cumpri-las, precisará de uma revolução na pecuária

Marina Piatto
Fazenda de gado na Amazônia (Foto: Filipe Redondo/ÉPOCA)

Já estão na mesa quase todas as metas de redução de emissões que os países do mundo inteiro levarão à conferência do clima de Paris, no fim do mês que vem. O encontro deverá definir o novo acordo climático global, com contribuições de todos os países do mundo para o esforço de mitigar a mudança do clima.
Ao anunciar a intenção de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030, o Brasil chega bem à conferência de Paris, a COP21. O país tornou-se o primeiro emergente a propor uma redução absoluta em toda a sua economia como contribuição para o objetivo global de manter o aquecimento da Terra abaixo do limite de 2oC neste século.
As metas anunciadas pela presidente Dilma Rousseff englobam os três principais setores emissores: uso da terra, energia e agropecuária.  para os setores de desmatamento e energia, elas são muito pouco ambiciosas: alcançar 45% de energias renováveis (mantendo o volume de hidrelétricas atual e incluindo 23% de renováveis como eólica, solar e biomassa na geração de eletricidade), zerar o desmatamento ilegal somente em quinze anos e somente na Amazônia e restaurar 12 milhões de hectares de florestas, provavelmente metade deles com eucalipto.
Para o setor agropecuário os objetivos assumidos foram: recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas e implementar 5 milhões de hectares de ILPF (integração lavoura-pecuária- floresta). As propostas anunciadas são ousadas, mas por um lado, poderiam ter sido mais abrangentes. Estima-se que a meta anunciada para agropecuária deverá reduzir as emissões em 28%, até 2030, tendo 2005 como referência. Em junho, o Observatório do Clima elaborou uma proposta de plano climático para o Brasil, a qual estima que mais de 40% de redução poderia ser alcançada no setor se as práticas de baixas emissões de carbono na agropecuária – que já são adotadas hoje – fossem amplamente implementadas.
Por outro lado, os compromissos assumidos por Dilma estão na direção certa,  por conta do grande potencial de redução de emissões que essas práticas demostram e pelo fato de a meta ser adicional aos objetivos que o país já adotou no passado. Ao menos no papel, portanto, a agropecuária está na vanguarda da redução de emissões do Brasil.
Assumir o compromisso, porém, é só metade do caminho. Para que ele prospere e não se torne vago, deve-se delinear uma estratégia clara para que essas ações cheguem ao campo. Assim, há necessidade de anunciar também de que maneira as metas para a agropecuária serão executadas e o qual será volume de recursos necessário para colocá-las em prática.
Caso contrário, o risco de chegarmos a 2030 sem alcançarmos a redução proposta para o setor pode ser grande. É desafiador recuperar 15 milhões de pastagens degradadas e introduzir 5 milhões de hectares de ILPF se o setor não tiver uma estrutura e um foco para a escala do impacto desejada.A avaliação do cenário atual é importante como lição para evitar erros que comprometam o alcance das metas futuras. O Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono), por exemplo, propôs em 2010 recuperar a mesma área de pastagens degradadas e implementar 4 milhões de hectares de ILPF,  além de outras práticas de baixa emissão até 2020. Porém, a velocidade das ações até o momento sinaliza que essas metas não serão alcançadas dentro do prazo.
Os mecanismos financeiros e de extensão rural também são tímidos. Em 2015, o Plano Safra diminuiu o volume de crédito destinado ao Programa ABC, que implementa as ações do Plano ABC; as taxas de juros também subiram, e os compromissos de fortalecer a extensão rural no Brasil não foram cumpridos. Não há nada que indique que a meta do atual Plano ABC será cumprida até 2020.  O crédito agrícola voltado à agricultura familiar (Pronaf) também não considera requisitos de baixas emissões em suas linhas de crédito deixando mais uma lacuna no desenvolvimento de baixo carbono proposto. Em resumo, o cenário atual não parece projetar um futuro muito auspicioso para as metas de 2030.
As tecnologias que permitem produzir com baixa emissão de carbono já existem, mas elas precisam chegar a todo o Brasil: a intensificação, o plantio direto, o manejo dos resíduos animais, a eficiência na adubação, a fixação biológica de nitrogênio precisam ganhar escala. Para isso, políticas agrícolas como o Plano Safra e o Pronaf devem adotar critérios de baixo carbono em suas linhas de crédito e seu desembolso deve ser desburocratizado.
 A extensão rural precisa ser ampliada para que os produtores melhorem a gestão de suas propriedades e alcancem mais eficiência com menos emissões. Parcerias público-privadas também podem acelerar o processo de adoção dessas tecnologias.
Outro aspecto importante é a colaboração de outros setores ligados à agropecuária para que a meta de redução seja alcançada. O planejamento integrado entre meio ambiente, infraestrutura e educação é fundamental para viabilizar a adequação ao Código Florestal, o escoamento e armazenagem da produção e a pesquisa e transferência de tecnologia relacionada ao setor rural.
 Atingir a meta proposta exigirá uma verdadeira força-tarefa, na qual a sociedade civil, o governo e as empresas privadas deverão trabalhar de forma conjunta para que a produção, a conservação e a redução das emissões possam colaborar, num curto espaço de tempo, com a manutenção do clima global dentro de limites suportáveis.
*Marina Piatto é engenheira agrônoma, Coordenadora da Iniciativa de Clima e Agricultura do Imaflora e integrante do Observatório do Clima, uma coalizão de 38 organizações da sociedade civil.
Fonte: Época


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