O município paraense de São Félix do Xingu apresenta um dos maiores índices de desmatamento da Amazônia Legal, abrigando ao mesmo tempo o maior rebanho bovino do País e um cenário de grandes áreas de pastagens subutilizadas, além de muito degradadas.
Contrapondo-se a esse cenário, temos no mesmo Estado a segunda maior produção de cacau do Brasil, cultivo que oferece recursos para estancar o desmatamento pela sua boa convivência com a mata nativa e pela liquidez que vem oferecendo nos últimos tempos. Ao longo de 2011, o cacau conquistou o melhor preço no mercado internacional dos últimos 30 anos.
Unindo as duas pontas - o quadro de degradação e a possibilidade de mitigação dessa realidade – nós, do Imaflora e instituições parceiras, estamos desenvolvendo um projeto que tem por objetivo agregar geração de renda à recuperação da paisagem de São Félix do Xingu. Ao lado da Cooperativa Alternativa dos Pequenos Produtores Rurais e Urbanos, que reúne 170 associados e mais de 800 fornecedores, iniciamos um trabalho que prevê, no espaço de três anos, o aumento da produtividade por hectare e a melhoria da qualidade do produto.
No projeto, contemplamos a introdução de práticas mais sustentáveis de produção e pós-colheita e a transferência de tecnologias mais apropriadas, que permitam aos pequenos produtores acessar mercados mais exigentes, incluindo a produção orgânica. Referimo-nos ao crescente mercado que busca oferecer ao consumidor um produto de origem conhecida e resultado de práticas amigáveis com o meio ambiente.
O desafio é grande, sobretudo porque implica mudança do perfil da atividade econômica de boa parte das famílias da região. De acordo com um diagnóstico inicial, baseado em um grupo-piloto composto por 40 cooperados, a maioria deles tem na pecuária de leite a principal fonte de renda. Boa parte desses cooperados saiu do Mato Grosso, Goiás, Maranhão e Piauí. Eles possuem, em média, 90 hectares de terra e têm no gado uma forma de poupança, mas se ocupa do cacau como segunda atividade.
Mesmo sem intimidade no trato com as frutas tropicais, esses cooperados começam a perceber as vantagens competitivas da cacauicultura. Há muito, é claro, o que ser aprimorado para atingirmos o êxito que queremos. Um desses aspectos é a fermentação do cacau, uma etapa decisiva para a boa qualidade da matéria–prima e essencial para a produção de um chocolate com boas características.
Exemplos bem-sucedidos na produção sustentável do cacau, como o da cidade de Altamira, também no Pará, mostram que o caminho escolhido pode ser trilhado com excelentes ganhos em todos os aspectos. É importante lembrar que, em São Félix do Xingu, estamos falando de uma região muito carente, na qual, para se ter uma idéia, nenhum produtor tem acesso a água tratada; 59% deles consomem água de nascentes e 38% tiram água de poços artesanais.
Outro aspecto que se apresenta como vantajoso sobre a pecuária é a necessidade de uma área proporcionalmente menor para o cultivo do cacau, que pode ser consorciado com outras atividades, como a silvicultura e a fruticultura, proporcionando uma receita maior por hectare. Além de uma alternativa economicamente viável, a estratégia nos permite frear o desmatamento e, com o tempo, iniciar a recuperação da cobertura florestal no município.
A partir da primeira visita feita em novembro do ano passado e com o apoio da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), Instituto Cabruca, Instituto Internacional de Educação do Brasil e financiamento do Fundo Vale, realizamos as primeiras oficinas de treinamento desse grupo de cooperados e esperamos concluir, em breve, as ações planejadas para o primeiro ano de projeto.
A meta é a de que, ao fim do processo, tenhamos levado essas práticas para cerca de mil fornecedores da cooperativa e que empresas do setor tenham reconhecido essa iniciativa (e a qualidade do cacau produzido) por meio de condições diferenciadas de comercialização junto aos produtores.
Para nós, são inúmeras as vantagens econômicas e socioambientais desse projeto. O sucesso em São Félix do Xingu seria uma contribuição para a geração de benefícios em várias regiões da Amazônia, que deve ser firmar como segundo maior produtor brasileiro de cacau com origem e produção responsáveis.
Eduardo Trevisan Gonçalves, engenheiro agrônomo, e Matheus Couto, engenheiro florestal e mestre em ecologia e sustentabilidade, são do Imaflora (www.imaflora.org). O Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) é uma organização brasileira, sem fins lucrativos, responsável pelas auditorias nas propriedades que utilizam o selo Rainforest Alliance Certified no Brasil.
Fonte: Sociedade Sustentável
Cacau é receita para gerar renda e frear o desmatamento no Pará
18/09/2011
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