Alessandra Morgado
Imagine um quintal cheio de árvores frutíferas. É certo
que na época da colheita parte das frutas será perdida. Foi observando seu
próprio quintal, que as agricultoras e agricultores familiares de São Félix do
Xingu, região do Sudoeste do Pará, criaram a Associação das Mulheres Produtoras
de Polpa de Fruta (AMPPF), que trabalha com frutas das agroflorestas, cacau e
de seus próprios quintais.
A entidade, que tomou corpo jurídico em 2012, foi gestada
na ADAFAX (Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar do Alto
Xingu), mais especificamente nos Grupos de Referência da Associação, que reunia
agricultores e agricultoras familiares dos grupos de Xadá, Maguary e Tancredo
Neves. A experiência nasceu da percepção da falta de aproveitamento das frutas
dos lotes. A Associação fez um levantamento de mercado, potencial comercial,
preferência de sabores e cotação de valores, o que apresentou resultado
promissor.
Administrada por mulheres, a Associação reúne produtoras
de polpa artesanal da comunidade de Maguary, Tancredo Neves e Nereu, que ficam
num raio que varia entre 20 e 50 km de distância na região de São Félix do
Xingu. Nada é perto ou fácil naquela região, por isso, foi necessário muito
esforço para colocar a ideia para funcionar buscando recursos, técnica,
capacitação e até inspiração.
Com mão-de-obra totalmente familiar, a Associação
processa e vende polpa de cacau, cupuaçu, acerola, cajá, açaí, manga, graviola,
maracujá, goiaba, tamarindo e outras espécies que estão ali mesmo no quintal
das associadas e dos associados, que participam em menor número da produção,
comercialização e administração da Associação.
As frutas são processadas em casa ou numa central em
Maguary, já que nesse distrito não havia luz elétrica no início do projeto,
aliás, problema que atinge quase toda a região. São os agricultores que
investem para fazer a energia elétrica chegar às propriedades em pleno ano de
2017.
“Cada família produz em casa e tudo é artesanal, mas
passamos por cursos de capacitação para aprender a fazer o processamento
adequado das frutas com todos os cuidados de higiene e saúde”, explica Maria
Helena Gomes, 27, que já foi presidente da Associação e participa desde a
formação do grupo.
O principal mercado para as polpas é a merenda escolar,
contudo as associadas buscam voos mais altos e, com a certificação orgânica das
propriedades que vem sendo implantada com apoio do Imaflora (Instituto de
Manejo e Certificação Florestal e Agrícola), esperam conseguir levar sua
produção para outras praças. O Instituto por meio de seu programa Florestas de
Valor apoia diversas organizações do município fomentando a agroecologia e
comercialização de produtos. No caso da Associação, a abordagem inicial é de
fortalecimento institucional e suporte para a comercialização.
O programa Floresta de Valor fortalece as cadeias de
produtos florestais não-madeireiros, dissemina a agroecologia para que as áreas
protegidas e seu entorno contribuam para o desenvolvimento regional,
proporcionando condições dignas às populações locais e conservação dos recursos
naturais. O programa atua na conservação da floresta nas regiões da Calha Norte
do rio Amazonas, na Terra do Meio e no município de São Félix do Xingu do
Estado do Pará. O Florestas Valor conta com o apoio do Fundo Amazônia.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)
determina que, no mínimo, 30% dos itens da merenda escolar sejam adquiridos de
agricultores familiares, o que gera uma demanda fixa de diversos gêneros
alimentícios, inclusive, polpa de fruta. Atualmente, o quilo de polpa é vendido
entre R$ 11 e R$ 12 para a merenda, já o açaí obtém até R$ 15 em lanchonetes e
padarias.
Maria Helena conta que no início o projeto era uma
complementação de renda das famílias e uma proposta para dar independência às
mulheres, contudo, com o tempo, se tornou a renda principal e sustento de
muitas famílias.
“A gente está trabalhando para conseguir uma estrutura
melhor de processamento e o selo de inspeção municipal, no mínimo, porque por
mais que a gente faça bem-feita, isso vai agregar valor ao produto”, afirma
Maria Helena.
A tesoureira da AMPPF, Maria Josefa Machado Neves, 45,
disse que com a venda da polpa as famílias passaram a ter uma renda fixa, além
disso, o processo de organização da Associação ajudou a mudar a mentalidade das
pessoas, que “tem gente que não tinha plantado nada, daí começou a mudar. O
pessoal começou a pensar diferente e acreditar nas coisas e, com certeza, ainda
vai mudar mais”.
Para as mulheres, a criação da Associação foi um caminho
para a independência financeira e também aprender a empreender na floresta, já
que são elas que realizam toda a comercialização de seus produtos. “Aprendemos
mais com os erros do que com os acertos”, explica Maria Helena.
Com foco e bom ânimo, o grupo de 19 mulheres – o que
significa também 19 famílias – trabalha por melhores resultados e reinveste
parte dos recursos da venda na Associação. “A gente trabalha com as frutas que
eram perdidas nas propriedades, o que significa que temos ainda potencial para
crescer em produção e também área para plantar mais”, diz a atual presidente da
Associação Elisangela Barros da Silva, 33.
Uma das frentes de luta da Associação é conquistar um
selo de produto orgânico, a exemplo da produção de cacau da Cooperativa
Alternativa Mista de Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax), que reúne os
produtores rurais (alguns também são maridos das associadas) de cacau,
jaborandi e castanha do Brasil.
Breve histórico da Associação
Entre a ideia da Associação e sua operacionalização, esse
grupo de mulheres campesinas teve que vencer diversas dificuldades, como a
falta de energia elétrica, a inexperiência com a produção e venda de produtos e
a autogestão.
A Associação das Mulheres teve apoio da CAMPPAX, que
concedeu por dez anos, em regime de comodato, um ponto comercial para a
entidade. Os recursos da reforma do imóvel e alguns insumos foram cobertos por
recursos do projeto Fronteiras Florestais, além do programa Usinas de Trabalho
do Consulado da Mulher, entre outras iniciativas.
A proposta começou a nascer em 2011, numa iniciativa da ADAFAX (Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar do Alto
Xingu), que desenvolve um trabalho de apoio à geração de renda na região, por
meio de ações que valorizaram e potencializavam as características locais.
No início, 38 famílias participaram da proposta, mas o
grupo se firmou em 19. A primeira venda de polpa de frutas ocorreu ainda em
2011, antes mesmo no nascimento oficial da AMPPF que foi oficializada em 2012.
Com apoio da Associação, as mulheres produtoras de polpa conseguiram levar seu
produto para a merenda escolar da região, que continua até hoje sendo o maior
mercado de seus produtos.
Darlene
e Kethly - Maguary