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Pauta socioambiental no Brasil: precisamos falar sobre a proposta da reforma trabalhista

16/07/2017

Por Heidi Buzato e Ana Cristina Nobre da Silva
Assistimos com perplexidade e preocupação o momento que estamos atravessando no Brasil, especialmente com as propostas de mudanças na agenda ambiental, social e trabalhista. Os itens de alteração na CLT são extensos e devem alterar significativamente as relações de trabalho. Além das alterações para os trabalhadores urbanos, decorrentes da reforma trabalhista sancionada pelo presidente da República, preocupa ainda mais a criação de legislação específica para alterar os direitos dos trabalhadores rurais, caso outro projeto de lei venha a ser aprovado (PL 6.442/2016), projeto que suspende a aplicação da CLT aos trabalhadores rurais e pretende limitar a atuação da Justiça do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho.
No texto aprovado da reforma trabalhista existem alterações relacionadas aos modelos de contratação e remuneração. Estão previstas também alterações nas regras para rescisão de contrato de trabalho, que não mais exigirá, entre outras coisas, a obrigatoriedade de que rescisões de contratos de mais de um ano sejam realizadas no respectivo sindicato dos trabalhadores ou perante autoridade do Ministério do Trabalho ou em qualquer outro órgão público, na falta desses. Em relação à jornada de trabalho está previsto, por exemplo, o fim das horas in etinere (que permite contabilizar as horas de transporte na jornada de trabalho). O texto da reforma prevê ainda, para uma série de temas, a prevalência do negociado sobre o legislado, o que significa que serão válidos e legalmente aceitos os acordos estabelecidos entre empregadores e empregados, mesmo que abaixo do que prevê a legislação. Temas como jornada de trabalho, intervalos de almoço, organização no local de trabalho, enquadramento de insalubridade, poderão ser livremente negociados entre patrões e empregados.
Considerando a realidade dos trabalhadores rurais, universo em que o Imaflora atua, mesmo com um conjunto de dispositivos legais assegurando direitos aos trabalhadores e trabalhadoras rurais e mesmo havendo empregadores que prezam pelo atendimento à legislação, ainda persiste uma forte cultura no meio rural brasileiro de não atendimento à legislação trabalhista, sob argumentos e práticas diversas. Em um cenário em que muitas vezes o trabalho rural é realizado em locais ermos e distantes dos grandes centros, em locais onde nem sempre existe infraestrutura pública (como hospitais, escolas, postos do INSS), tampouco a presença de sindicatos de trabalhadores ou órgãos de fiscalização do governo, trabalhadores e trabalhadoras rurais estão sujeitos a serem submetidos a condições de trabalho precárias e degradantes. Infelizmente no Brasil atual não são raras situações onde são encontrados trabalhadores em condições análogas a trabalho escravo. De acordo com dados do Ministério do Trabalho, em 2016, 885 trabalhadores foram resgatados de condições de trabalho análogas ao trabalho escravo através de ações de fiscalização e de combate ao trabalho escravo. Este número é 34% menor do que o número de resgates realizados no ano de 2015, porém reflete também uma redução significativa no número de fiscalizações realizadas no ano de 2016.
Sistemas de certificação socioambiental, como os que são conduzidos pelo Imaflora, surgiram visando oferecer garantias a consumidores de que produtos de origem florestal e agrícola não sejam produzidos a partir de condições de trabalho degradantes ou análogos a trabalho escravo. Porém, existem muitos desafios para se melhorar as práticas trabalhistas no meio rural, em especial nas atividades terceirizadas, porque a terceirização, em geral, é uma prática que muitas vezes implica em condições precárias de trabalho; e nas contratações de mão de obra para períodos da safra ou para atividades pontuais, porque a agricultura convencional ainda mantém práticas de contratação de trabalhadores migrantes, temporários ou sazonais, utilizando estratégias que, muitas vezes, burlam a atual legislação trabalhista.
A aprovação da reforma trabalhista, coloca em risco conquistas importantes e ainda inacabadas no meio rural. Corremos o risco de retroceder anos de esforços empreendidos até aqui para melhorar a situação dos trabalhadores e trabalhadoras no meio rural brasileiro. É necessário que organizações efetivamente preocupadas com a sustentabilidade social nas cadeias produtivas no Brasil coloquem em suas pautas de atuação como se posicionarão frente às propostas de reforma trabalhista, uma vez as bases sob as quais sempre trabalhamos ameaçam ruir, exigindo novas estratégias de atuação. 

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Heidi Buzato é socióloga, formada pela Unicamp, com mestrado na área de recursos florestais pela ESALQ/USP.  Está cursando doutorado em Gestão e Planejamento Territorial na Universidade Federal do ABC. No Imaflora é a responsável técnica pela área social.

Ana Cristina Nobre da Silva é socióloga, mestre em Sociologia pela UFRJ, sócia da Ambiente Social Consultoria e consultora do Imaflora.

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