Enquanto o ambiente político passava por momentos críticos, as empresas que buscam seguir boas práticas socioambientais procuraram se diferenciar da parte do setor que ainda não se convenceu de como as mudanças climáticas são prejudiciais para o próprio agronegócio. Para isso, estas empresas buscaram, cada vez mais, mostrar que estão contribuindo com o esforço de combate à crise climática, eliminando práticas prejudiciais ao meio ambiente e promovendo o trabalho digno em suas cadeias produtivas por meio de seus compromissos sociais e ambientais. Assim, a área de serviços ESG (governança ambiental, social e corporativa, ou environmental, social, and corporate governance, em inglês) do eixo de Cadeias Florestais e Agropecuárias Responsáveis do Imaflora viu a procura aumentar ainda mais.
Certificações, verificações, construção e auditoria de padrões socioambientais, entre outros, são cada vez mais demandados por empresas e produtores que querem demonstrar seu comprometimento com a sustentabilidade para clientes, parceiros e sociedade em geral. “As empresas têm procurado serviços customizados, têm buscado no Imaflora soluções que permitam conhecer melhor seus fornecedores e mitigar riscos para a compra de matérias-primas, para garantir um processo de melhoria contínua”, afirma Eduardo Trevisan, gerente de Cadeias Agropecuárias do Imaflora.
O Elos Raízen, por exemplo, parceria de 8 anos entre a empresa produtora de biocombustíveis e energia, o Imaflora e a ONG Solidariedad promove o desenvolvimento sustentável contínuo junto a cerca de 2 mil produtores e fornecedores de cana-de-açúcar. O programa passou a englobar a auditoria na cadeia de custódia, garantindo a rastreabilidade e a sustentabilidade ao longo de toda a cadeia produtiva. “Este é o primeiro passo para você conseguir depois ter a cana, o etanol e o açúcar Elos com um selo, com o diferencial de que tem todo esse componente de sustentabilidade”, explica Daniella Macedo, Coordenadora de Cadeias Agropecuárias do Imaflora. No começo do ano ocorreu o primeiro ciclo de auditorias, que devem ter seu segundo ciclo no começo de 2023. Além disso, o Imaflora também teve a oportunidade de participar dos principais eventos organizados pela empresa, como a Convenção Agro Raízen e o Fórum de Sucessores, alcançando diversos parceiros com os resultados de sua atuação junto à Raízen.
O aspecto social também teve grande atenção por parte do Imaflora ao longo do ano. O estudo “Contribuições para a mitigação dos efeitos da pandemia da covid-19 na cadeia do suco de laranja”, por exemplo, avaliou os impactos socioeconômicos que ela proporcionou em trabalhadores contratados e agricultores familiares, com recomendações aos produtores e empresários envolvidos para medidas que atenuem esses efeitos no período pós-pandemia. Além do estudo, o projeto envolveu a produção de uma série de vídeos e podcasts que ajudaram a disseminar dados e informações. Outro exemplo é o trabalho junto à Proforest e Nestlé de devida diligência na cadeia da cana. Em um formato piloto, o projeto está sendo aplicado em duas usinas fornecedoras de açúcar para a Nestlé de São Paulo e Minas Gerais. A iniciativa envolve treinamentos e um dia de campo e, após o término do piloto, que deve ocorrer em março de 2023, o programa deve prosseguir. “Além da questão ambiental e climática, estamos atuando mais forte na área de Direitos Humanos dentro das cadeias”, afirma Daniella.
Preocupadas em cumprir compromissos socioambientais, como metas de redução ou neutralização de emissões de gases de efeito estufa, muitas empresas têm investido em políticas socioambientais ou protocolos próprios para acompanharem a trajetória desses compromissos. Ao longo de 2022, o Imaflora contribuiu em diversos projetos como a revisão da política de compra responsável da Braskem; a criação de um manual de boas práticas socioambientais para a empresa Delta Sucroenergia, abordando temas como contratação, migração, uso correto de equipamento de segurança e demais aspectos sobre prevenção ao trabalho análogo à escravidão e infantil; e o desenvolvimento de um protocolo de agricultura regenerativa para a General Mills, voltado para produtores de mandioca, milho pipoca e batata. “A preocupação com a agricultura regenerativa tem crescido dentro das empresas que atuam diretamente com o consumidor, o que acabou sendo bastante estratégico para o Imaflora”, afirma Eduardo.
Outra empresa para a qual o Imaflora contribuiu com ações de agricultura regenerativa foi a Nespresso, dentro do programa Nespresso AAA, que abrange práticas sustentáveis de produção (como manejo do solo e uso de variedades resistentes, que demandam menos água e defensivos) e prevenção ao trabalho análogo à escravidão. O Imaflora desenvolveu dois documentos para facilitar a classificação e designação das propriedades que utilizam práticas de agricultura regenerativa. Ao longo do ano, foram realizadas diversas atividades como treinamentos junto a técnicos da empresa, que poderão replicar as análises nas cerca de 1.200 propriedades fornecedoras da Nespresso; dia de campo e checklist aplicados para a prevenção de trabalho degradante. Além disso, foi formado um grupo de trabalho entre o Imaflora e os fornecedores da empresa.
Dentro ainda da cadeia produtiva do café, o Imaflora desenvolveu para a Nestlé um projeto para a conservação de recursos hídricos e remanescentes florestais em 20 propriedades de café no Espírito Santo, que resultou no desenvolvimento de dois manuais de boas práticas de conservação, e um modelo de diagnóstico para ser replicado pelos técnicos da empresa. Oséias Mendes da Costa, Coordenador de Projetos do Imaflora, explica que as propriedades foram escolhidas de forma a representar um recorte das 2 mil unidades fornecedoras da Nestlé. “Apontamos a necessidade de incluir um componente que permitisse a replicação desse trabalho. Para isso, criamos um modelo de diagnóstico com o cuidado necessário para a escolha das 20 propriedades, de forma que elas representassem as 2 mil”.
Do café para o guaraná, o programa Olhos da Floresta, que prevê a rastreabilidade do guaraná adquirido pela Coca-Cola para garantir que tenha sua origem no estado do Amazonas, firmou um projeto com a Fundação Coca-Cola, no qual foram adquiridos equipamentos para facilitar a torra e o escoamento da produção. Também foram realizadas diversas capacitações junto aos produtores, feita a disseminação de um caderno de campo digital com o objetivo de melhorar a gestão das propriedades a partir do uso da tecnologia como aliada para o gerenciamento e a rastreabilidade, além da reforma de usinas de beneficiamento. Em 2022, o Imaflora também realizou três projetos piloto de uma estação de tratamento dos resíduos do guaraná, para que tenham a destinação correta. A ideia é que o projeto possa ser replicado para todos os produtores nos 15 municípios de atuação do Olhos da Floresta.
“O ano de 2022 foi um ano muito abençoado, voltamos às atividades de campo após a pandemia. Com o técnico do Imaflora, foi realizado o treinamento de capacitação de rastreabilidade do produto, tivemos atividade de campo para as boas práticas, além das visitas de intercâmbio. A Associação Intercomunitária Grupo Esperança Orgânica (GEO) foi contemplada com equipamentos que são de muita relevância para o bom andamento da produção e de operação administrativa, além do projeto de construção da feira de exposição de produtos na sede da associação, reforma e construção de casas onde os grãos são torrados”, afirma Nazide dos Santos Bentes, produtora familiar na cadeia do guaraná e presidente da GEO. “A parceria com o Imaflora e a Coca-Cola é de suma importância para a GEO e seus associados desenvolverem suas atividades com mais eficácia, tanto no campo produtivo, como na administração.”
As certificações florestais e agrícolas também se beneficiam de um ambiente de maior pressão internacional por consumo consciente, além da transição para uma política ambiental positiva. “Foi um ano de crescimento e expansão de portfólio na área agrícola, onde passamos a fazer certificações da SAI Platform e C.A.F.E. Practices (protocolo de certificação dos fornecedores de café da empresa Starbucks)”, afirma Luiz Iaquinta, gerente de Certificação Socioambiental do Imaflora. “Abrimos novas frentes e estamos entrando no mercado de certificação de soja, no padrão RTRS”, completa.
Com quase três décadas de tradição e expertise na área, em 2022 o Imaflora alcançou relevantes percentuais de renovação de contratos de certificação, com 60% dos clientes da área agrícola e 30% da área florestal renovando contratos de longo prazo, de cinco anos, com algumas das maiores empresas do País. Para atender essa demanda, a equipe também se fortaleceu. “Tivemos um sucesso muito grande na capacitação e atração de novos talentos para a área de certificação. Conseguimos habilitar uma série de auditores, superando um cenário de dificuldade por conta da pandemia”, conta Luiz. A área agrícola mais que dobrou seu quadro de auditores, passando de 16 para 36, e a área florestal incorporou 10 novos profissionais. “A marca da atuação do Imaflora em nossa longa interação tem sido a aplicação do princípio da imparcialidade, o que confere consistência aos processos de certificação. Temos acompanhado as adaptações da organização ao longo do tempo e mantemos expectativas positivas de sustentação das boas práticas junto com as inovações que o Imaflora vem buscando em termos de abrangência da atuação”, afirma Ivone Namikawa, consultora de Sustentabilidade Florestal na Klabin.
Outro importante destaque na área de certificação florestal foi a atuação do Imaflora na Assembleia Anual do FSC®, que, entre diversas discussões e decisões, definiu a vitória de uma moção sobre paisagens de florestas nativas, que permitiu que as empresas que já possuem certificações em áreas florestais, como a Amazônia, possam permanecer com a certificação, promovendo uma manejo florestal sustentável. Com isso, cerca de 500 mil hectares de áreas florestais garantiram a permanência da certificação, com todos os critérios e auditorias previstos. Essa decisão dá segurança, não apenas às atuais empresas certificadas, mas também aos possíveis contratos futuros. Com o avanço da agenda de concessões florestais, cresce também a procura por certificações por parte das empresas vencedoras dos processos de concessão. Somente no estado do Amazonas, que concentra grande parte das florestas públicas não destinadas no país - são 40,3 milhões de hectares -, está na fase de finalização de estudos de concessão a Floresta de Maués, e existem outras cinco glebas em processos iniciais de estudos. Conforme já anunciado pela nova ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, as concessões florestais são uma das apostas para frear o desmatamento na Amazônia. “Tivemos demandas interessantes na área de florestas naturais. Principalmente de serviços de verificação de contratos de concessão, a chamada Auditoria Florestal Independente (AFI)”, conta Ricardo Camargo, coordenador de Certificação Florestal do Imaflora.
O ELO COM O SETOR EMPRESARIAL
Outro importante elo quando se fala em cadeias agropecuárias responsáveis é o setor empresarial. Afinal, ele tem o poder de direcionar seus investimentos, empréstimos, linhas de financiamento, entre outros, para negócios e iniciativas comprometidos com critérios ESG e uma transição para uma economia sustentável. Mas, para garantir que seus investimentos estejam sendo realmente direcionados para projetos alinhados com esses princípios, é preciso que haja uma série de controles e salvaguardas.
Em 2022, o Imaflora seguiu atuando com o protocolo criado para o programa Meta Florestal do Fundo Vale, que ajuda a mapear projetos de restauração florestal por meio de Sistemas Agroflorestais (SAFs), acrescentando o componente de geoprocessamento como complemento ao trabalho que já vinha sendo feito em campo. No segundo ano da iniciativa, houve uma melhoria do protocolo de salvaguardas socioambientais e o início do acompanhamento dos planos de ação, com a comparação das evoluções de cada projeto em relação ao protocolo. A ideia é que as avaliações sejam feitas semestralmente. Enquanto em 2020 as restaurações alcançavam mil hectares, em 2022 chegaram a 7 mil. A meta é que, até 2030, alcancem 100 mil hectares restaurados com SAFs.
“O Imaflora é um parceiro extremamente relevante para o Fundo Vale, atuando no processo de salvaguardas socioambientais, como avaliador de terceira parte, dos Negócios de Impacto apoiados pelo Fundo Vale na Meta Florestal 2030 da Vale. Por meio do processo de devida diligência (due diligence) é possível avaliar o sistema de gestão e as áreas de produção dos empreendimentos, aumentar a visão crítica e sistêmica dos negócios e, assim, mitigar riscos relacionados ao compliance social e ambiental e, ainda, oferecer a oportunidade de fortalecimento dos sistemas de gestão dos negócios”, afirma Juliana Vilhena, Líder de Gestão de Impacto e Inovação Socioambiental do Fundo Vale. “Em 2022, o Imaflora a partir da sua atuação colaborativa, aprimorou o processo de due diligence e atuou de forma educativa para estimular uma agricultura sustentável, coerente em relação à legislação, às melhores práticas e com redução do grau de risco socioambiental.”
Outro exemplo de que é possível conciliar boas práticas ambientais com a produtividade vem da região do Médio Vale do Araguaia, no Estado do Mato Grosso. A iniciativa Araguaia Sustentável reúne criadores de gado para promover boas práticas de produção e recuperação de áreas degradadas. O Imaflora é parceiro da iniciativa que, em 2022, atraiu mais 16 produtores para a adoção do protocolo de melhoria contínua “Garantia Araguaia”, desenvolvido pelo instituto especialmente para o projeto. Para disseminar a iniciativa junto aos pecuaristas, foram realizados diversos webinares ao longo do ano, com centenas de visualizações.
CACAU: O ALIADO IDEAL DA RESTAURAÇÃO
Se a agricultura regenerativa tem se tornado uma forma sustentável de produção, a restauração é fundamental para recuperar áreas degradadas, em locais que não foram utilizadas boas práticas. O cacau é um forte aliado para a restauração, por ser um fruto nativo. O programa Farmer Coaching, uma parceria com a empresa Cargill, encerrou seu ciclo de três anos em 2022. Ao longo do ano, o programa promoveu assistência técnica para 47 produtores de cacau da rede de fornecedores da empresa, com a realização de visitas técnicas individualizadas e dias de campo sobre temas como cooperativismo, manejo de pragas e nutrição do solo. Além do Farmer Coaching, o Imaflora desenvolve uma série de ações na cadeia do cacau junto ao CocoaAction Brasil, braço brasileiro do WCF (World Cocoa Foundation), como parte do “Projeto Cacau 2030: Ações Estruturantes para o Desenvolvimento Sustentável da Cadeia no Brasil”. Ao longo do ano, mais de 3 mil produtores receberam assistência técnica, além de atividades como Dias de Campo, participação em feiras e eventos da cadeia de cacau e chocolate e produção de estudos. “A grande vantagem do Cacau 2030 é que ele torna as ações em prol da cadeia sustentável do cacau visíveis e, com isso, com potencial de crescerem e gerarem novas iniciativas”, afirma Vítor Santos, coordenador de projetos do Imaflora, responsável pela coordenação das iniciativas relacionadas ao cacau.
* Esse texto faz parte do relatorio anual do Imaflora 2022. Confira o documento na integra aqui.