O ano de 2022 foi marcado pelos 10 anos da criação do Código Florestal. Para acompanhar o status de implementação da lei, foi lançado em dezembro o Termômetro do Código Florestal, desenvolvido pelo Observatório do Código Florestal (OCF) em parceria com diversas organizações, dentre as quais o Imaflora. A ferramenta levanta dados críticos como o de que existem mais de 42 milhões de hectares de sobreposições de cadastros de imóveis rurais privados sobre terras públicas, indígenas, quilombolas e assentamentos delimitados pelo INCRA. Isso se deve ao fato de que, apesar da primeira fase do Código ter avançado, que é o autocadastro do imóvel, a fase de vistoria pouco avançou nesse período, favorecendo o mau uso da legislação para cadastros fraudulentos. Ao ocupar áreas públicas ou Terras Indígenas, por exemplo, fazendo uso de um dado falso registrado no sistema do Cadastro Ambiental Rural (CAR), certamente essas áreas terão sua vegetação derrubada, resultando no aumento das emissões brasileiras.
Outra fonte de contribuição para as emissões do setor de mudança de uso da terra a partir do desmatamento foi a produção de soja, conforme estudo feito pela Trase, em parceria com o Imaflora e divulgado em dezembro de 2022. A pesquisa mostrou que, no ano de 2020, 562 mil hectares de soja foram cultivados em áreas desmatadas nos cinco anos anteriores, principalmente no Cerrado, onde 264 mil hectares tiveram esse uso. Já os Pampas responderam por outros 196 mil hectares desmatados no mesmo período. Mesmo na Amazônia, onde vigora um acordo que proíbe o plantio em áreas desmatadas após 2008, foram detectados 133 mil hectares com soja produzida após desmatamento recente. No total, toda essa área convertida resultou em 103 milhões de toneladas de CO2 emitidas na atmosfera, o que corresponde a 11% do total que é emitido por ano no Brasil no segmento de mudança de uso da terra.
Do mesmo modo que estes dados mostraram os danos aos biomas desmatados, outros apontaram para a viabilidade de soluções futuras. Um estudo inédito feito pelo Observatório do Clima no âmbito do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), no qual o Imaflora faz parte na produção dos cálculos do segmento agropecuário, mostrou que o Brasil pode reduzir suas emissões de metano em 36% até 2030 em relação aos níveis de 2020. Isso é mais do que o corte de 30% que o Brasil se comprometeu na COP-26, de Glasgow, em 2021. Entre as medidas para que esse percentual seja alcançado estão o desmatamento ilegal zero, a erradicação dos lixões, o manejo de dejetos de animais na agropecuária e o melhoramento genético do rebanho. “Foi um marco, uma vez que não havia um estudo com dados sobre o metano no Brasil. A repercussão alcançou pesquisadores que estudam o tema. Foi um resultado muito positivo “, afirma Renata, que participou do estudo.
Ainda em relação às emissões da pecuária, outro importante destaque foi a seleção pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) de um consórcio, liderado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), formado pelo Imaflora e outras organizações, como Agrotools, Waycarbon, WRI e DSM para o desenvolvimento de uma calculadora que medirá todo o ciclo de vida para as emissões da pecuária, desde os insumos na produção agrícola até o processamento industrial. A ferramenta, que será desenvolvida em 2023, contribuirá para estimular projetos de pecuária de baixo carbono.
Foi com o olhar para o futuro que o Imaflora participou dos principais eventos da ONU para o clima, como a Conferência de Bonn, em junho, e a COP-27, em novembro, realizada no Egito. Na Conferência de Bonn, o Imaflora atuou principalmente para sugerir melhorias para a governança do Grupo de Trabalho Koronivia para a Agricultura Sustentável, que busca dar escala a soluções de mitigação e adaptação no setor agrícola, dado seu impacto na mudança do clima. Já durante a COP-27, além de acompanhar as discussões, o Imaflora participou de eventos e debates, apresentando estudos sobre a distância que o Brasil ainda está de cumprir sua meta estabelecida para o Acordo de Paris.
TRANSFORMANDO DADOS EM INFORMAÇÕES ACESSÍVEIS COM O GEOPROCESSAMENTO
Imensos bancos de dados, imagens de satélite, softwares de última geração e linguagens de programação são aliados do trabalho em campo. Uma parte considerável do trabalho do Imaflora é desenvolvido com ferramentas de geoprocessamento, com uma equipe dedicada para lidar com as tecnologias mais atuais. Grandes quantidades de dados e informações que seriam inacessíveis ao público leigo podem ser acessados depois de processados e tratados. Projetos como a plataforma dos programas Boi na Linha, Soja na Linha e o Atlas da Agropecuária só são possíveis com esse trabalho. Além disso, durante a pandemia, muito do trabalho de verificação e auditoria teve de ser feito por meio de sensoriamento remoto. Em 2022, a área de geoprocessamento foi responsável pela nova plataforma que permite acompanhar a implementação do Código Florestal na Mata Atlântica e diversos estudos sobre o mercado madeireiro, a partir da plataforma Timberflow, outro exemplo de uso de big data para a disponibilização de informações de modo acessível.
Para contribuir com outras organizações e órgãos de governo, o Imaflora também promoveu cursos sobre ferramentas como o servidor de mapas digitais Geoserver e o Google Earth Engine (GEE), no âmbito do programa SERVIR-Amazonia. “A parceria do SERVIR-Amazonia com o Imaflora em atividades técnicas e de engajamento de usuários do Programa tem se mostrado de fundamental importância para a implementação das ações estratégicas no Brasil. A equipe do Imaflora tem desenvolvido trabalho de alto nível, com impacto no fortalecimento de organizações parceiras e no desenvolvimento de comunidades e territórios da Amazônia. O trabalho envolve o co-desenvolvimento da tecnologia TerraOnTrack, a coordenação e condução de treinamentos em práticas e usos de tecnologia geoespacial, e até mesmo a coordenação administrativa de contratações e enlaces institucionais”, afirma José Leandro R. Fernandes, Líder de Engajamento do Usuário do SERVIR-Amazonia.
* Esse texto faz parte do relatorio anual do Imaflora 2022. Confira o documento na integra aqui.