Até 22 de novembro, chefes de estado, delegações diplomáticas, organizações da sociedade civil, corporações e representantes da iniciativa privada estarão reunidos em Baku, capital do Azerbaijão, para a 29ª Conferência das Partes, ou COP 29. Na pauta, dois assuntos espinhosos: a negociação dos investimentos para mitigação e adaptação à crise climática (ou nova meta quantificada coletiva – NCQG, na sigla em inglês) e a necessidade de que os países aumentem seus compromissos de redução de emissões (as chamadas NDCs). Após um ano de eventos climáticos extremos em diferentes partes do globo, o mundo acompanha com interesse crescente as negociações para conter o aquecimento global em 1,5 ºC frente à média de temperatura pré-Revolução Industrial até 2030. O Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) estará presente ao longo de todo o evento, com foco nas discussões sobre investimentos, agricultura, sistemas agroalimentares e florestas.
Agropecuária e sistemas agroalimentares
O setor agrícola e pecuário é o único setor econômico com um grupo de trabalho próprio na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC). Ele foi criado em 2018 para durar quatro anos e renovado por igual período em 2022, na COP 27, de Sharm el-Sheikh. Na primeira fase, cumpriu uma agenda bastante conceitual e teórica. Agora, no meio deste ano, durante a Conferência de Bonn, formatou um roadmap de ações até 2024. Para dar partida a elas, os países participantes da COP 29 devem aprovar o texto elaborado em Bonn, dando sinal verde para a realização de dois workshops; a criação de um portal com avanços em projetos e políticas nacionais para agropecuária de baixo carbono; e a elaboração de um relatório sobre financiamento de adaptação e mitigação no setor. Outra herança de COPs passadas que precisa evoluir nessa Conferência diz respeito à Declaração sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Alimentares Resilientes e Ação Climática, assinada por 133 países, inclusive o Brasil. Ela objetiva uma transição para sistemas agroalimentares justos e sustentáveis da produção ao consumo, passando por armazenagem, transporte e processamento. Um ponto importante é a recomendação aos países signatários para incluírem ações e metas relacionadas à agropecuária nos seus planos nacionais de mitigação e adaptação.
Refletindo a importância crescente do setor, nessa COP haverá um Dia da Agricultura, em 19 de novembro, quando será lançada a iniciativa Baku Harmony, assim chamada porque se propõe a conciliar as diferentes iniciativas e declarações sobre sistemas agroalimentares e segurança alimentar, além de ser um local de voz para pequenos produtores e outras populações rurais vulneráveis, sob a liderança da FAO.
Acordo de metano
Firmado em 2021, na COP de Glasgow, o Acordo de Metano conta com mais de cem países signatários, inclusive o Brasil. O compromisso é reduzir 30% das emissões desse gás até 2030, tendo como linha de base as emissões de 2005. Alguns entendem que cada país deve reduzir 30% das próprias emissões, enquanto outros, incluindo o Brasil, interpretam que a redução de 30% não constitui meta individual, mas do grupo signatário. Em 2023, de acordo com o SEEG, o metano resultante da fermentação entérica em bovinos foi uma das principais causas do aumento de emissões pela agropecuária no Brasil e o problema só vem se agravando. A intensificação da produção, com abate precoce, é a principal medida mitigadora e o país ganharia muito se a tornasse uma política pública. Nota-se que o governo brasileiro tem se mostrado bastante vocal em relação à agenda e atuante junto a coalizões, como o Climate and Clean Air Coalition, organização que financia medidas para a redução do metano advindo da pecuária. Ainda assim, é preciso um esforço maior para controlar o aumento das emissões.
Da COP 29, espera-se que os países sejam instados a cumprir seus compromissos, fazendo com que os planos nacionais de redução de metano ganham escala, velocidade e monitoramento. O metano tem um potencial de aquecimento 28 vezes maior do que o dióxido de carbono (CO2), mas sua vida útil é muito menor. Significa que sua redução permitiria retirar grande quantidade de gases com alto potencial de aquecimento em um prazo relativamente curto, o que traria um fôlego na contenção do aumento da temperatura.
Financiamento climático
O Acordo de Paris previa que os países desenvolvidos investissem, desde 2020, 100 bilhões de dólares ao ano no esforço de mitigação dos países em desenvolvimento. As nações ricas afirmam que fizeram os aportes; quem devia ser beneficiado diz que os recursos se transformaram em empréstimos sem qualquer benefício. Falta transparência sobre o assunto. E o fato é que uma nova conta se impõe, jogando essa cifra para a casa dos trilhões. Calcula-se que, para combater os efeitos das mudanças climáticas, serão necessários investimentos que beiram 5 trilhões de dólares ao ano até 2030. Agora, para que qualquer acordo estabelecido não seja apenas retórico, a Conferência precisará estabelecer como esse dinheiro irá chegar ao destino nos próximos cinco anos – por quais meios (bancos multilaterais, grandes corporações, governos), para que países e a que custo são questões inevitáveis.
Outra discussão necessária é quanto desse dinheiro será destinado a adaptação para que os países se tornem mais resilientes e quanto deverá financiar medidas de mitigação, essenciais para conter o aquecimento global.
No Brasil, o financiamento para adaptação é tema sensível para a agricultura. O país submeteu à consulta pública um plano de adaptação que contempla o setor agrário, mas sobram dúvidas e indefinições. A agropecuária responde por quase 30% das emissões brasileiras e a redução desse número depende de medidas mitigatórias. Além disso, tornar os sistemas produtivos menos emissores e mais removedores de gases de efeito estufa aumenta sua resiliência e capacidade de adaptação. Negociações de financiamento, portanto, devem trazer luz para a divisão entre mitigação e adaptação.
Florestas
A busca de apoio para a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) deve ser uma das pautas que o governo brasileiro irá tratar nessa COP 29, a exemplo do que já fez na COP 16 da Biodiversidade, em outubro. Outro tema de peso para o setor florestal e que estará na mira de diferentes coletivos e organizações é a integridade dos sistemas de certificação de REDD. O mecanismo ficou abalado frente à opinião pública após questionamentos a cálculos de verificação por sistemas de crédito de carbono reconhecidos mundialmente. Já no primeiro dia da COP 29 foi fechado um acordo para estabelecer o que dá direito a crédito de carbono ou não. Até agora foram reconhecidos como geradores desses créditos a substituição de fonte de energia suja por energia limpa; o reflorestamento de áreas degradadas; e o investimento em tecnologias ambientais. O tema vem ganhando expressividade desde Dubai e seria promissor que agregasse à pauta definições sobre os direitos das populações tradicionais e indígenas.