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O cenário ambiental brasileiro em 100 dias de Governo Bolsonaro e as dificuldades para a articulação de parcerias com a sociedade na busca de soluções

11/04/2019

Vistos de longe, do alto das arenas de combate da Roma Antiga, os gladiadores lutavam entre si, defendendo de forma violenta o que lhe importava naquele contexto – no caso, a própria vida. Eram observados não só pelo público, mas geralmente por uma autoridade – por vezes o próprio Imperador – que detinha poder de, com apenas um gesto, determinar a vida ou a morte daqueles homens. Não muito longe dali e, aproximadamente, na mesma época, a cidade grega de Atenas exercitava a democracia, um sistema de governo que tem por premissa a escuta de opiniões diversas – por vezes divergentes – na procura por soluções e definições para os rumos da sociedade em ambientes bem diferentes do das arenas: as assembleias, usando como ‘arma’ a palavra, ao invés da espada.

A história e a cultura Greco-Romana nos ensinam que, conforme o ‘tom’ da autoridade governamental, assembleias podem se tornar arenas. Também nos mostram que sempre que os espaços de diálogo e concertação política são esvaziados e erodidos do seu propósito inicial de criação de consenso e busca por soluções, tornam-se arenas de disputa política polarizada, que levam por vezes à violência e quase sempre a uma inércia das esferas governamentais em encontrar e aplicar soluções aos reais problemas da sociedade. Não se resolvem problemas complexos sem parcerias construídas custosamente, em torno de um propósito comum. Soluções inteligentes afloram de ambientes de diálogo em que todas as visões e opiniões têm voz e escuta ativa.
Aos 100 dias do Governo Bolsonaro, o que vemos é que das 35 medidas prioritárias anunciadas para este período, em que somente duas tratavam de questões ambientais (o Plano Nacional para combate ao lixo no Mar e o Sistema de Recuperação Ambiental, sobre as multas do Ibama), apenas uma foi cumprida e nenhuma delas sequer rascunhava um plano, uma ideia ou uma ação para resolver os gravíssimos problemas ambientais que temos no Brasil, entre eles, citando apenas os absolutamente mais gritantes: o óbvio – e inegável depois de Brumadinho – modelo equivocado de exploração de minérios no Brasil, o aumento do desmatamento desenfreado (e ilegal) na Amazônia e a perda de solos agricultáveis, relegados à erosão, poluição e degradação, que já somam, num número ainda estimado, pelo menos 60 milhões de hectares.

Os 100 dias do Governo Bolsonaro, no que tange ao escopo de atuação do Ministério do Meio Ambiente (MMA), revelam que não há um planejamento para enfrentar estas questões.
Em janeiro de 2019, o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), detectou que 108 km² de florestas foram desmatados na Amazônia Legal brasileira, um aumento de 54% em relação a janeiro de 2018.
Este crescimento indica que as ações promovidas pela atual gestão do MMA, com o argumento de aumento de controle e eficiência, resultaram no desmantelamento de agências ambientais consolidadas, como Ibama, Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e, consequentemente, na fragilização das suas atuações, agravando ainda mais o cenário problemático da política ambiental no Brasil.
A primeira reunião do Conama deixou evidente o posicionamento do atual ministro do MMA, Ricardo Salles, em relação aos espaços de diálogo e concertação política em torno das questões ambientais. Houve quebra de regimento, com os suplentes sendo impedidos de participar – inclusive com imposição de força e violência e discussões esvaziadas e abreviadas. Não demorará para esta assembleia se tornar uma arena.
Em discurso recente na Marcha dos Prefeitos (9 de Abril/2019), o presidente Jair Bolsonaro citou como uma grande meta o desenvolvimento racional da Amazônia. Mas, como o presidente e seu ministro pretendem desenvolver racionalmente a Amazônia? Tal desenvolvimento trará como premissa o fomento à economia da floresta em pé, a valorização comercial dos produtos da sociobiodiversidade e a aplicação da ciência e da tecnologia (e pesquisa) a serviço de novos modelos de uso e conservação dos recursos naturais, sempre em consonância com os povos tradicionais e a população brasileira que vivem na e da floresta, como caboclos, ribeirinhos, indígenas e também pessoas que vivem nos inúmeros pequenos e grandes centros urbanos do Norte do Brasil? Além disso, eles responderão sobre como abandonarão o antigo modelo de exploração da Amazônia, que suprime a floresta a baixo preço e traz majoritariamente pobreza e degradação ambiental, para um modelo inovador, que dê valor real ao que mais o tem, e que é amplamente dito e repetido pelo presidente Jair Bolsonaro: nossas riquezas naturais, entre elas a maior delas, a Amazônia?
O Imaflora tem a profunda convicção – comprovada ao longo dos seus quase 25 anos de existência – de que não há como solucionar os problemas, bem como aproveitar oportunidades da Amazônia e de outros territórios brasileiros com predominância de recursos naturais, sem uma profunda construção de parcerias com toda a sociedade em torno deste propósito comum. As ONGs têm a responsabilidade – e no caso do Imaflora, toda a disposição – em colaborar com o Governo Brasileiro nesse caminho, porém, é dado ao alto comando a obrigação de orquestrar esta conjunção de forças, intenção e expertises. E para isso é preciso espírito de liderança e muita habilidade. Sobretudo, é preciso ainda que os altos mandatários do país saibam dar valor aos espaços de diálogo estabelecidos e consigam enxergar nas opiniões diferentes a oportunidade de inovar no estabelecimento de metas e ações concretas que tragam real progresso ao Brasil.
Infelizmente para alguns, e felizmente para outros, não estamos mais na Roma Antiga e a vida ou a morte – aqui neste caso, da política ambiental brasileira – não será determinada por um gesto do Imperador, mas, sim, por um esforço coletivo em defesa das causas ambientais. Em assembleias ou arenas, cabe ao novo Governo decidir.

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